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"Quatro notas sobre a destruição do skatepark", por João Curvêlo

 

O executivo da Câmara Municipal de Odivelas decidiu destruir uma parcela muito significativa do skatepark. O negócio, que envolve o financiamento da empresa McDonalds, é um disparate absoluto num concelho que tem um défice gigantesco de equipamentos para a juventude. Deixo à vossa consideração quatro notas breves sobre o assunto:

1. Na verdade, ao que consta, esta é uma segunda versão de um projecto que previa a destruição da totalidade do espaço. A reacção negativa dos skaters e a pressão política do Bloco de Esquerda terão ditado um recuo por parte do executivo. É assim mesmo que deve ser: não há prepotência que resista à democracia e à participação cidadã. Aliás, estranho é que, no mesmo ano em que a Câmara Municipal de Odivelas apresenta uma (interessante) proposta de execução de um Orçamento Participativo Jovem, este executivo exclua os jovens da decisão sobre o espaço público e sobre o futuro das suas vidas;

2. No dia a seguir às notícias que davam conta da destruição do skatepark, um dos partidos com acento na Assembleia Municipal de Odivelas, o Bloco de Esquerda, deu entrada com um requerimento que questionava o executivo da Câmara Municipal de Odivelas sobre o assunto. O Regimento deste órgão define que o executivo tem “trinta dias úteis para responder aos requerimentos da oposição”. Contudo, o executivo da Câmara demorou mais de dois meses a fazê-lo. Um dirigente nacional do Partido Socialista dizia há uns tempos, sobre o governo de Alberto João Jardim, que “a qualidade de uma democracia se mede pela sua relação com a oposição”. Ora, a Câmara Municipal de Odivelas não respeita politicamente a oposição, nem tão-pouco cumpre os requisitos legais a que está obrigada. Resta saber o que diria esse mesmo dirigente do Partido Socialista sobre o executivo municipal dirigido pelo seu próprio partido;

3. O que se confronta nesta discussão sobre o skatepark não é apenas o futuro daquele espaço. Confrontam-se duas visões distintas de cidade e dois projectos autárquicos que trilham caminhos distintos. A ideia de destruir o skatepark, num concelho com um défice enorme de espaços públicos, é o absurdo a tomar conta da decisão política: estão a utilizar o pouco dinheiro que existe para destruir os poucos equipamentos que existem;

4. Muito se fala hoje da inevitabilidade desta obra. A execução e o planeamento da mesma não são uma inevitabilidade: são uma escolha política, que tem decisores concretos e que afecta a vida de muitos jovens. É por isso tão importante clarificar a posição de todos sobre esta matéria. Até agora, o Bloco de Esquerda foi o único partido a levantar a voz pela defesa deste espaço. A maioria que governa o município, com a complacência de um silêncio ensurdecedor das outras forças políticas, tem hoje uma posição que se vai tornando complicada de defender: é que não se pode fazer política em nome das pessoas e, no momento decisivo, votar contra os direitos dessas mesmas pessoas (e tão importante que é o direito ao usufruto do espaço público). A existência de propostas alternativas para o espaço é um sinal de que a democracia está viva e que se confrontam propostas diferentes. Aliás, no dia em que a democracia for feita de uma só escolha, mais vale mudar-lhe o nome para ditadura.